
Velhice ou envelhecimento são palavras que causam desconforto, principalmente às mulheres. Algumas ficam traumatizadas com a possibilidade, natural, do envelhecimento. Mas não são apenas as mulheres que se preocupam; nos tempos bíblicos, o próprio salmista preocupava-se com esse período da vida, suplicando a proteção de Deus quando já não desfrutasse do vigor da mocidade: “Não me rejeites na minha velhice; quando me faltarem as forças, não me desampares” (Salmo 71.9). A visão do envelhecimento é pessimista. As fases da infância, adolescência e juventude são vividas como se o entardecer da vida nunca chegasse. Não há tempo para se pensar no fim da existência. Assim, não é de admirar quando os primeiros sinais de envelhecimento surgem causando angústia naquela pessoa que os detecta. Olhar-se no espelho só traz tristeza por conta das descobertas indesejadas que ele expõe. Mas envelhecer é uma arte!
A pessoa envelhece independentemente de sua vontade, mas se o seu envelhecimento vai ser proveitoso, depende dela. Para que o envelhecimento se processe bem, há necessidade de cultivarmos algumas virtudes. Portanto, examinemos algumas virtudes tais como a serenidade, que é abandonar a si mesmo e sua vida e entregar-se a Deus. Tem a ver com a tolerância, não interfere no valor das outras pessoas, não precisa mudá-las. É viver sem pressão. Vem a seguir a paciência que se assemelha à serenidade. A pessoa serena é sempre também paciente. Paciência, no grego, tem o termo hypomone, que significa “ficar sob, carregar algo, suportar algo, aguentar algo, resistir”. Assim, a paciência é como uma coluna que dá sustentação à vida. Eu suporto a outra pessoa com seus defeitos e fraquezas. Virtude de convivência. É preciso saber conviver, esperar, ser paciente no consultório médico, no supermercado e nas outras filas que se apresentam diante de nós…
Outra virtude importante é a mansidão. Quem na velhice usa de mansidão com as pessoas e as coisas, atrai a todos. Ela reúne boa disposição, não exclui nada do que diz respeito à própria vida. Nada exclui da própria história de vida, tudo faz parte e configura o que eu e você somos agora. Consequentemente a virtude da liberdade deve ser cultivada. É preciso libertar-se da obrigação de ter de demonstrar alguma coisa a alguém. Também não precisa mais colocar à prova sua força; permite a si mesmo ser quem ele é. Mas, só dominaremos bem o envelhecimento, se aprendermos também a virtude da gratidão. Quem está sempre insatisfeito e tem a impressão de haver sido prejudicado em sua vida jamais poderá usufruir aquilo que veio a ser. Não pode desfrutar com gratidão suas lembranças. Nem consegue alegrar-se realmente pelo momento atual. Somente pessoas agradecidas são capazes de criar amizades e viver em comunidade. A pessoa ingrata é desagradável, constrangedora. É incapaz de agradecer aquilo que lhe damos. Destrói a afinidade dos corações. Não gosta de festejar e é incapaz de sentir alegria. Quem tem recordações agradecidas pode desfrutar sua solidão e tem sempre algo por que agradecer, mesmo que não esteja passando bem e doenças o oprimam. Pode agradecer tanta coisa em sua vida passada. Porque, de acordo com o Salmo 92.14: “Na velhice ainda darão frutos, serão viçosos e vigorosos.”
Ainda pode-se desenvolver uma nova capacidade de amar. De alguns homens e mulheres de idade pode-se dizer que seu rosto irradia amor. Seu rosto é velho e enrugado; contudo, está cheio de amor. Pelo fato de terem amado muito em sua vida e por terem aprendido a amar sua própria vida, tornaram-se agora amor. “O amor tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo suporta” (1Coríntios 13.7).
A sabedoria popular judaica e grega enumeram algumas virtudes que devem honrar as pessoas idosas. “Se não ajuntaste na mocidade, como encontrarás alguma coisa na velhice? Quão belo para os cabelos brancos saber julgar e, para os anciãos, saber dar conselhos! Como é bela a sabedoria dos velhos, a reflexão e o conselho daqueles que honramos! A coroa dos velhos é uma experiência rica, e sua glória, o temor do Senhor” (Eclesiástico 25.3-6).
As estações do ano podem se aplicar às fases de nossas vidas e de um modo geral a toda a nossa existência, são imagens que expressam o envelhecimento.
Na primavera, a infância e a juventude, quando a vida brota e floresce, nesta fase o ser humano vai crescendo, florescendo, amadurecendo, fazendo descobertas e desabrochando para a vida. Mas a primavera não dura sempre e chegamos à alta maturidade, quando o período do verão entra em vigor.
O verão pode ser representado pela idade adulta, com seus dias cheios de sol. As temperaturas permanecem elevadas, os dias são longos e as noites pequenas. O verão é o período do ano reservado às férias. Em nossas vidas, após o florescimento da primavera, vem o verão, onde nossos sonhos começam a frutificar e passamos a colher o que plantamos.
Mas chega o outono, que tem por significado “tempo de ocaso”. Ocaso significa “pôr do sol, poente, decadência, declínio, ruína, fim, final, termo, morte”. O outono é caracterizado por baixas temperaturas e pelo amarelar e queda das folhas das árvores. Há fases em nossas vidas que se parecem com o outono. A velhice seria como o outono em sua beleza. O outono tem a função de nos preparar para o inverno. O outono é tempo de maior frutificação, ele está produzindo frutos invisíveis.
Na arte de envelhecer imitamos o outono e o inverno, um belo e produtivo, o outro cheio de calma e paz. Ambos repletos do calor do amor. Tanto em um quanto no outro podemos ver marcas de experiências negativas… O inverno pode demorar a chegar, mas um dia ele chega para todos. As folhas da saúde e da energia já começam a amarelar e cair, e a temperatura da existência começa a baixar. A experiência acumulada, a vivência com as mais diversas situações vão forjando e fortalecendo o caráter de quem não ficou “na janela olhando a banda passar…” Ao invés de deixar-se embalar pela tristeza e saudades do passado, envelhecer com dignidade pode dar às mulheres muitas alegrias. Recomeçar bem se seu começo não foi saudável; espalhar amor, ternura e carinho, se foi sempre tão rígida, sendo mais flexível e consciente da sua temporalidade e efemeridade. Sobretudo, envelhecer com uma confiança sempre crescente Naquele que é eterno e “colocou a eternidade em nossos corações”, pois “tudo fez Deus formoso no seu devido tempo” (Eclesiastes 3.11). Envelhecer sem se esquecer da sublime arte de envelhecer. Pois quem não envelhece foi colhido em alguma estação da vida, antes de chegar ao ocaso…
Luzelucia Ribeiro da Silva é professora e escritora.