Por Carlos Alberto Di Franco
“Não existe família perfeita. Não temos pais perfeitos, não somos perfeitos, não nos casamos com uma pessoa perfeita nem temos filhos perfeitos. Temos queixas uns dos outros. Decepcionamos uns aos outros. Por isso, não há casamento saudável nem família saudável sem o exercício do perdão. O perdão é vital para nossa saúde emocional e sobrevivência espiritual. Sem perdão a família se torna uma arena de conflitos e um reduto de mágoas. Sem perdão a família adoece. O perdão é a assepsia da alma, a faxina da mente e a alforria do coração. Quem não perdoa não tem paz na alma nem comunhão com Deus. A mágoa é um veneno que intoxica e mata. Guardar mágoa no coração é um gesto autodestrutivo. É autofagia. Quem não perdoa adoece física, emocional e espiritualmente. É por isso que a família precisa ser lugar de vida e não de morte; território de cura e não de adoecimento; palco de perdão e não de culpa. O perdão traz alegria onde a mágoa produziu tristeza; cura, onde a mágoa causou doença”.
Essa reflexão, atribuída ao Papa Francisco, é profundamente tocante e verdadeira. Ela nos lembra que as famílias, como qualquer outro grupo humano, não são perfeitas, e que, justamente por isso, o perdão se torna essencial para a saúde emocional e espiritual de todos. O perdão é um remédio contra as feridas que inevitavelmente surgem nas relações familiares, seja entre pais e filhos, casais ou outros membros da família.
Essa mensagem pode ser aplicada às relações sociais e ao espaço destinado ao debate público e ao exercício da política. A mágoa, quando sistematicamente alimentada, pode ser um veneno, que destrói não só as relações, mas também o convívio político.
A atual situação do Brasil preocupa. E muito. O País, polarizado e radicalizado, precisa recuperar a tranquilidade. O governo tem muita responsabilidade no clima de radicalização. Lula é um populista carismático, mas não é um estadista. Está com o olho no retrovisor. O tempo todo. Só os estadistas são capazes de expulsar o rancor da alma e olhar com grandeza para um projeto maior. Não vejo isso no presidente da República. Ele está algemado por uma imensa mágoa e refém do ressentimento. A vingança não é um instrumento de crescimento. Lula está longe, muito longe, da grandeza de um Nelson Mandela. Depois de passar 27 anos preso, submetido a uma injustiça inominável, Mandela não ficou prisioneiro do passado. Virou a página. Olhou para frente. Construiu uma magnífica biografia.
Do outro lado do espectro político, o governo de Jair Bolsonaro teve algumas conquistas relevantes, como a reforma da Previdência, a autonomia do Banco Central, a lei de Liberdade Econômica, o Novo Marco Legal do Saneamento e algumas privatizações. Seu estilo conflitivo, no entanto, contribuiu muito para o aumento da temperatura e para o clima de radicalização que castiga o Brasil.
Na terça-feira, 19 de novembro, os brasileiros receberam, atônitos, a notícia de uma operação da Polícia Federal que investigou um suposto plano de golpe de estado que teria previsto nada menos que os assassinatos do então presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, seu vice, Geraldo Alckmin, e o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal.
Não é necessário enfatizar a gravidade das denúncias. Tudo precisa ser apurado com total transparência. O Supremo Tribunal Federal tem o dever de apresentar não apenas indícios, mas provas robustas do suposto episódio.
Para que as apurações e o julgamento cheguem a bom porto, é preciso que a Polícia Federal e, principalmente, o STF se comportem de modo mais técnico e menos político. Neste sentido, indevidas declarações fora dos autos, não raro antecipando julgamentos, não contribuem para os esclarecimentos dos fatos.
Parece-me imprudente a decisão do presidente da Corte, ministro Luís Roberto Barroso, de entregar a Alexandre de Moraes a relatoria do inquérito. Mais uma vez -e num caso extremamente grave e sensível- Alexandre de Moraes figura simultaneamente como relator e vítima em potencial. Independentemente da capacitação do ministro, é imperioso dar uma mensagem claríssima de isenção.
O Brasil precisa de paz. Mas a pacificação do País passa pelo respeito à verdade e por um sincero esforço de conciliação. A História mostra que a grandeza de alma é capaz de superar situações difíceis. O presidente Juscelino Kubitschek foi um estadista de verdade. Após assumir a Presidência e ainda no primeiro mês de seu mandato, o fundador de Brasília enfrentou uma revolta armada contra o seu governo. Militares da Aeronáutica se organizaram num levante contra o presidente. Sufocada a rebelião, como devia ser, JK anistiou todos os envolvidos. O presidente era um homem sem retrovisor, sem ódios e sem amarguras. Olhava para frente. Tinha a grandeza dos estadistas.
Saudade do diálogo, da liberdade, da tolerância. O bem comum não chega pela mão de salvadores da pátria. Ele é fruto de um consenso que demanda autoridade moral, serenidade e capacidade de negociação. Em 2026, que já está ai, o País precisa de um estadista.
O Brasil vive um momento muito grave. É hora de se pensar no país e no seu povo.
Jornalista. E-mail: difranco@ise.org.br