Frida Vingren, uma missionara sueca que foi uma das pioneiras na fundação das Assembleias de Deus no Brasil, foi recentemente ordenada como pastora, mesmo tendo decorrido décadas após sua morte.
Vale lembrar que, até bem pouco tempo atrás, as Assembleias de Deus sequer reconheciam o ministério pastoral feminino. Portanto, não deixa de ser surpreendente que agora, não só tal titulação é reconhecida, como é concedida de forma retroativa a quase cem anos atrás.
É óbvio que a inovação pegou muita gente de surpresa, pois, pelo que se sabe, é a primeira vez, na história das Assembleias de Deus, que alguém se torna pastora apenas no papel, considerando o fato de que ela jamais poderá exercer tal missão por não se achar mais entre os viventes.
A grande pergunta que se faz é: qual seria o propósito de tal iniciativa? Os autores dizem que é uma forma de reconhecer o legado por ela deixado. Até aí, tudo bem, pois, de fato e de direito, Frida foi bastante representativa e muito destemida em tudo quanto realizava em prol da obra da referida igreja.
Além de ser autora de belos hinos da Harpa Cristã (cancioneiro das Assembleias de Deus), teve um papel preponderante na condução de várias frentes de trabalho nos primórdios da denominação. Por ser uma pessoa extremamente determinada, chegou a despertar ciúmes entre pastores e líderes da época.
Seu atuação destacada fez com que sofresse calúnias e perseguições cruéis, tendo seus detratores chegado ao cúmulo de pedir sua exclusão do rol de membros da igreja.
Claro que, por tudo isso, Frida estava por merecer uma reparação digna do resgate de sua história de vida, mas ordená-la agora a pastora foi a melhor decisão?
É entendimento basilar, entre os evangélicos, que o ministério pastoral jamais deve ser confundido com “título honorífico”. Ninguém deve ser consagrado ao pastorado por uma questão de honra ao mérito.
Entende-se que pastor não é um cargo “benemérito” a ser atribuído a alguém como homenagem ou demonstração de apreço ou gratidão. Também não se trata de uma patente a ser concedida para empoderar hierarquicamente uma pessoa perante as demais.
De acordo com a tradição assembleiana, o pastor deve ser alguém vocacionado para cumprir a desafiadora tarefa de cuidar de um rebanho. Daí a estranheza da inovação adotada pela atual cúpula de um dos ministérios das Assembleias de Deus no Brasil.
Pairam no ar as seguintes indagações: seria Frida o primeiro caso de uma mulher evangélica a ser submetida ao processo de reconhecimento tardio pelos feitos espirituais extraordinários e, digamos, até milagrosos? Estariam abrindo a porteira para futuras “beatificações” de pessoas que, em vida, foram consideradas relevantes para a história de suas respectivas igrejas? Espera-se que não! Contudo, não seria inoportuno fazer um alerta: o *todo* começa sempre pela *parte*. O pequeno gesto de hoje pode abrir as portas para outras grandes inovações no amanhã. Não custa nada ficarmos bem atentos, pois é de reconhecimento do público evangélico que os verdadeiros galardões, reservados a cada serva e servo “bom e fiel”, serão concedidos diretamente pelo Senhor da Seara no grande dia do encontro com Ele.
Peniel Pacheco é pastor, professor de teologia e articulista do Repórter Brasília.