O projeto de lei complementar 41/2024, que trata do Plano de Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília (PPCUB), ainda não está pronto para ser votado pela Câmara Legislativa. Esta é a posição de vários especialistas que participaram de comissão geral na tarde desta quarta-feira (15) para debater a última versão do PPCUB, enviada pelo governador Ibaneis Rocha ao parlamento local.
A iniciativa da comissão geral partiu da Comissão de Educação, Saúde e Cultura (CESC) e já é a terceira ocasião neste ano em que a Câmara Legislativa promove debate público sobre o tema. O presidente da CESC, deputado Gabriel Magno (PT), ressaltou que a preservação do conjunto urbanístico da cidade não impede o desenvolvimento local. “O fato de Brasília ser patrimônio cultural da humanidade é um aliado do desenvolvimento, e não um inimigo, como alguns pensam. É a preservação que garante um desenvolvimento sustentável da cidade”, observou. Em relação ao projeto de lei complementar, o parlamentar apontou para o risco de retirada de competência do Legislativo. “O PL do PPCUB retira atribuições desta Casa e isso é inaceitável”, criticou.
Para o professor Benny Schvarsberg, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UnB, o projeto carece de mais conteúdo relativo à preservação. “Prevalece a função de plano de uso e ocupação do solo em detrimento ao plano de preservação. Além disso, estão sendo passados vários cheques em branco, pois o projeto prevê a aprovação de alterações por decreto, passando por cima inclusive desta Casa”, destacou. José Leme Galvão Júnior, do Fórum das Entidades em Defesa do Patrimônio Cultural Brasileiro, também criticou a falta de dispositivos de preservação na proposta do governo. “Não reconhecemos nesse projeto um plano de preservação”, afirmou.
A professora Angelina Nardelli, do Conselho de Defesa do Patrimônio Cultural do DF, vinculado à Secretaria de Cultura, também apontou deficiências no projeto. “Ainda não foram apresentados os planos de preservação. Esse projeto ainda não está pronto. Ele não responde a uma política ativa da gestão do território, sua conservação e restauro. O projeto inclui uma política ativa de ordenamento territorial de uma cidade comum, não de uma cidade como Brasília, que é tombada pelo patrimônio histórico. Não há determinação da preservação da paisagem de Brasília como um todo. Essa legislação sequer descreve o objeto tombado em si”, observou.
A constatação de que o projeto de lei complementar ainda precisa ser aperfeiçoado também foi compartilhada pela arquiteta Maria Emilia Stenzel, do Conselho Internacional de Monumentos e Sítios da Unesco. “Identificamos que o PPCUB traz uma série de lacunas conceituais do ponto de vista da preservação e lacunas normativas que dificultam os objetivos principais do plano”, disse.
Além de apresentar deficiências conceituais e normativas para a preservação urbanística de Brasília, o projeto também corre o risco de ser questionado por inconstitucionalidade. Essa é a avaliação da promotora do Ministério Público do DF, Marilda Fontinele. “Eu vislumbro muitas inconstitucionalidades nesse projeto. O norte do plano é a preservação das quatro escalas urbanísticas de Brasília. Mas como vamos preservar as quatro escalas se não temos um inventário prévio? Nós precisamos primeiro inventariar todas as escalas. Precisamos definir precisamente o objeto da preservação. Além disso, esse plano é tão aberto que passa por cima deste parlamento. Se o projeto for aprovado, ele poderá ser modificado a qualquer momento sem a participação desta Casa. O que vejo nesse plano é a regularização de uma série de irregularidades”, criticou. A promotora fez ainda um apelo aos deputados distritais: “Faço um apelo ao Legislativo: não deixem uma questão tão cara para Brasília desaguar no Judiciário, pois a decisão judicial nem sempre atende aos anseios da sociedade como um todo”, alertou.
Para a ex-deputada distrital Arlete Sampaio, os problemas relativos à preservação do conjunto urbanístico da cidade poderiam ser melhor resolvidos se houvesse um órgão público dedicado exclusivamente à preservação. “O problema é que Brasília não tem um órgão gestor desse patrimônio. E se não há quem faça a gestão do patrimônio, também não há quem fiscalize”, observou.
A deputada Paula Belmonte (Cidadania) ressaltou a importância de se discutir e votar um projeto dessa magnitude sem urgência. “Não precisamos ter pressa. O projeto está sendo elaborado há dez anos, mas foram vários atores diferentes nesse período. Os representantes do povo precisam analisar e opinar sobre o projeto. Queremos votar um projeto que seja o melhor possível. Não podemos ser pressionados para votar esse projeto no primeiro semestre”, afirmou a deputada.
Por fim, a secretária adjunta da Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação (SEDUH), Janaina Vieira, procurou defender a proposta elaborada pelo governo. “Esse é um projeto complexo, que está sendo discutido há mais de 10 anos. Já passou por várias gestões, vários secretários. Pode ser que este não seja o melhor projeto de lei, mas é o projeto que a gente tem. O plano não é um cheque em branco. Evitamos mexer em parâmetros urbanísticos, como altura, afastamento, etc. Temos casos de regularização? Sim, infelizmente a cidade foi mudando e a legislação não acompanhou as mudanças. Estamos autorizando novos usos para os lotes, mas isso não vai impactar no tombamento”, respondeu. A secretária também se colocou à disposição de todos os participantes para discutir pontos do projeto.
Repórter Brasília/Eder Wen – Agência CLDF