Tudo novo… de novo? (Sandro Xavier)

Sandro Xavier/Divulgação

A cada momento de virada de ano, por ocasião do réveillon, convivemos com o clima de “hoje é um novo dia, de um novo tempo… todos os nossos sonhos serão verdade”.

Isso é bom? Até pode ser positivo se olharmos para esse momento como uma oportunidade de rever a vida, revisitar nossas atitudes e tomar essa ocasião uma chance de reajustar aquilo que está descarrilado em nossa trajetória.

É importante reconhecermos que, todos e todas nós, seres humanos, temos nossas agruras na vida. Somos feitos de luz e sombra, já diziam os poetas, e também, no fim, só nos restam sombras e pó. Nesse olhar humilde e consciente da nossa real condição, devemos ter a certeza de que podemos buscar o melhor para as nossas vidas, mas somos honestos ao entendermos que, ao perseguir a excelência e o equilíbrio, é possível que tomemos decisões equivocadas ou, até mesmo, que não consigamos fazer aquilo que é o mais correto para nós ou para aqueles que nos circundam.

Diante disso, ter a oportunidade de rever nossa trajetória e avaliar o que foi bom, ou seja, o que podemos e até devemos repetir; e o que não foi bom, significa dizer que temos muito a evitar, deixar de fazer mesmo; é de importantíssima relevância em nossa vida.

Esse ciclo que nos oportuniza rever nossa caminhada é muito importante, especialmente para que não cultivemos a tão famosa máxima que se propaga aqui por nossas terras tupiniquins, a saber, a “síndrome de Gabriela”: “Eu nasci assim, eu cresci assim e sou mesmo assim, vou ser sempre assim. Gabriela, sempre Gabriela”. Alguém que não admite que tem aspectos de si passíveis de arranjos, que seriam bons não somente para si, mas para quem está ao seu redor, é alguém que, evidentemente, não tem jeito.

É notório que esbarramos, por aí, com autoavaliações que beiram o bom humor, lançando chistes com situações que precisamos rever em nossas vidas, mas que, na maioria das vezes, não conseguimos. Exemplos mais recorrentes são as dietas e as necessidades de praticar exercícios físicos.

O humor que nós, especialmente os brasileiros, temos com nossas limitações também nos faz suportar nossas fraquezas com resiliência. Meu avô, um dia, já no alto dos seus 90 anos, nos dizia, a mim, e a meus irmãos e primos, ao responder à pergunta “como fazer para viver esse tanto de anos?”, que o segredo era “rir de si mesmo”. Sempre me lembrei disso, apesar de que nem sempre consigo fazê-lo.

Entre as piadas sobre a dieta e sua necessidade de perder peso, temos a famosa: “Houve boatos de que eu não conseguiria emagrecer até o fim do ano. Podem confirmar os boatos”. Ainda podemos destacar aqueles que já têm certeza de que não vão conseguir realizar essas promessas e brincam com isso: “No ano que vem, juro que começo uma dieta. Só vou esperar passar o carnaval, a Páscoa, as festas juninas, o Natal e o ano-novo”.

Geralmente, as promessas de ano-novo giram em torno das famosas “emagrecer (e aí levar a sério a dieta e os exercícios físicos), parar de fumar, parar de beber, economizar, estudar mais, etc.”. Essas, geralmente, no fim do ano, são acompanhadas das piadas que lembramos anteriormente. Quem, de fato, consegue qualquer avançozinho que seja vira exemplo e uma feliz exceção.

Mas podemos e devemos ir muito mais além disso. Nossas ações que chegam a prejudicar nossa convivência, nossa melhoria, nosso equilíbrio, nosso tempo de qualidade, não somente para as outras pessoas, mas para nós mesmos, devem ser medidas a fim de que nossa caminhada seja de fato evolutiva pessoalmente. Não falo de agradar às pessoas ou de satisfazer “leis” de instituições ou organizações. Essas regras de convivência em grupos sociais são o mínimo que podemos fazer e, geralmente, são estabelecidas para que possamos respeitar os limites das outras pessoas. Mas falo, principalmente, daquilo que podemos melhorar, ajustar e evitar, a fim de que nossa própria vida, para nós mesmos, seja satisfatória e não autodestrutiva.

Exemplos poderiam ser muitos, afinal, cada um e cada uma de nós têm seus desejos e necessidades bem diferentes. Respeitar os limites das outras pessoas é um bom objetivo também. Por isso, as regras de reflexão sobre nossa caminhada são bem pessoais. Não há uma lista de “promessas” padronizadas para todos os seres humanos desta terra. Cada um deve refletir sobre si mesmo e buscar o que seria bom para si, dentro de suas possibilidades e estabelecendo um avanço possível, por menor que seja. O que já seria uma grande vitória a ser celebrada no fim do ano vindouro.

No livro do Apocalipse, registrado nas Sagradas Escrituras para os cristãos, ou seja, a Bíblia, encontramos no capítulo 21, versículo 1, o seguinte: “Vi novo céu e nova terra, pois o primeiro céu e a primeira terra passaram, e o mar já não existe”. Isso porque o mar era sinônimo de ameaça para as pessoas daquela época. Era onde habitava o Leviatã. O mar revolto era símbolo do mundo cheio de perigos e o barco significava a igreja que nos abrigava em segurança.

Ao pensarmos no novo ano, é legítimo, sim, que tenhamos essa visão de uma nova terra de convivência e de atitudes. É bom que você imagine que poderá agir de forma diferente para que tenha bons resultados para a convivência com as outras pessoas, mas também, e principalmente, para si próprio. Isso também será, certamente, uma boa para quem convive com você, mas, da mesma forma, vai ser bom para Deus, que vai ver aquela sua criatura amada evoluindo de verdade… por dentro e por fora!

Sim, sabemos que é somente mais uma meia-noite que inicia um outro dia qualquer, mas vá além disso e aproveite a oportunidade desse clima de revisitar a vida, rever as atitudes e programar coisas boas para si e para as outras pessoas. Vai dar certo! Vai ser bom! Feliz ano-novo e feliz ano novo!

Sandro Xavier é Linguista e Teólogo.

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