Por Edgar Lisboa

Não é de hoje que as tensões entre China e Estados Unidos vêm ganhando contornos cada vez mais intensos.
Áreas como inovação tecnológica, expansão comercial, estratégias diplomáticas têm estado na pauta de ambas nações na tentativa de manter ou ampliar suas influências no mundo globalizado.
O último lance dessa luta está trazendo reflexos em um campo, até então, considerado inimaginável: as relações entre esses governos e a fé cristã.
“Sabe-se, há muito, que os Estados Unidos têm sido vistos como uma nação que exerce grande influência no campo religioso. Missionários evangélicos e católicos foram enviados para os quatro cantos da Terra (inclusive à China) implantando igrejas e distribuindo Bíblias traduzidas nas línguas e dialetos dos povos alcançados pelas “missões americanas”, afirmou o professor de teologia, de Brasília, Peniel Pacheco.
Diferentemente dos Estados Unidos, a China tem sido vista como país opositor ao Evangelho devido ao regime político de orientação marxista, o qual, segundo se enfatiza, seria totalmente contrário à religião.
Entretanto, parece que os novos tempos estão alterando esse cenário.
Na opinião de Peniel Pacheco, “com o retorno de Trump ao governo dos Estados Unidos, algumas medidas adotadas por ele tiveram um efeito colateral bastante desagradável para os cristãos estrangeiros que vivem ilegalmente no país.
Com a deflagração de ações policiais visando a deportação em massa dessas pessoas, as igrejas – especialmente as evangélicas – simplesmente se esvaziaram da noite para o dia, trazendo inquietação e constrangimento aos líderes cristãos, os quais, em sua grande maioria, apoiaram incondicionalmente o então candidato Donald Trump”.
O primeiro a reagir publicamente, foi o pastor Silas Malafaia. Em um vídeo divulgado em suas redes, ele contesta de forma veemente essa política de Trump. Segundo Malafaia “Ele [Donald Trump] tá certo em deportar gente que tem ficha criminal, agora, deportar gente trabalhadora, aí não. A grande força do trabalho pesado na América é feita por imigrantes e os Estados Unidos é o país dos imigrantes”. Malafaia relembra, ainda, que a própria América foi fundada por imigrantes puritanos após serem perseguidos e expulsos da Inglaterra.

A reação de Malafaia, não é por acaso. De acordo com relatos publicados na imprensa, muitos brasileiros evangélicos, que moram nos Estados Unidos, dizem que os cultos estão bem mais vazios. “As pessoas estão com medo até de ir para a igreja”, diz uma brasileira evangélica que preferiu não se identificar por medo da repressão. Esse medo se dá em razão da ordem emitida por Trump que autoriza que as prisões de imigrantes sejam realizadas, inclusive em escolas, clínicas e nos próprios templos religiosos.
Segundo o professor Peniel Pacheco, “diferentemente dos argumentos de Malafaia – e de outros líderes evangélicos brasileiros que temem pelo esvaziamento de seus templos – os pastores e bispos americanos enxergam outro motivo para se oporem à essa forma de repressão. Eles apresentam textos bíblicos que condenam o repúdio ao estrangeiro. Entre os textos mais citados está a passagem de Levítico 19:33-34: “Se o estrangeiro peregrinar na vossa terra, não o oprimireis. Como o natural, será entre vós o estrangeiro que peregrina convosco; amá-lo-eis como a vós mesmos, pois estrangeiros fostes na terra do Egito”.
Se há motivo de perplexidade para os líderes religiosos americanos e estrangeiros diante do consequente esvaziamento dos templos cristãos na América do Norte, por outro lado, não deixa de ser surpreendente o que vem ocorrendo na China. Dados atuais revelam que atualmente a China está posicionada como o país que mais produz Bíblias no mundo. Segundo matéria publicada pela BBC News, a indústria gráfica Amity “produz, em média, um exemplar [da Bíblia] por segundo”.
A mesma reportagem revela que “um levantamento de 2010 mostrou que há 67 milhões de cristãos na China”. Um crescimento significativo se for considerado que “em 1949, estimava-se que eles eram apenas um milhão”. Segundo especialistas ouvidos pela reportagem, “a China terá a maior população cristã do planeta até 2030”.
Não é por outro motivo que, até mesmo instituições que trabalham para difundir o Evangelho em países onde o cristianismo é oficialmente vedado, publicam manchetes como se vê no site da Missões Portas Abertas: “Ironia: China transforma-se na maior produtora de Bíblias do mundo.”
(Fonte: https://portasabertas.org.br/noticias/cristaos-perseguidos/noticia4135)
Até mesmo o site do Centro de Ajuda da Igreja Universal do Reino de Deus – cujos líderes se dizem totalmente contrários ao regime e ao governo chinês – estampa a seguinte manchete: “Fábrica chinesa produz uma Bíblia a cada segundo”. (Fonte: https://www.uckg.org/pt/fabrica-chinesa-produz-uma-biblia-a-cada-segundo/).
Aproveitando o termo ironia – citado na manchete da Missão Portas Abertas – acentua O professor de teologia Peniel Pacheco “é mesmo surpreendente verificar que os países, que se rivalizam em busca da liderança como maior potência econômica do mundo, ocupem hoje papéis invertidos no que tange à realidade histórica do cristianismo. Parece incompreensível saber que o país que sempre foi a favor da cristianização do mundo, está adotando medidas que resultam em empecilho à vivência da fé cristã em seu próprio território. Por outro lado, a China – que historicamente se posicionou contra o livre exercício da fé em seu território – hoje contribui para a produção e distribuição de Bíblias, tanto para o mercado interno, quanto para o externo.
Tal situação inusitada gera uma estranha sensação de desconforto em muitos cristãos sinceros: como explicar as dificuldades surgidas para cultuar a Deus em um país “amigo”, ao passo que, em um país tradicionalmente “inimigo”, se observa a impressão em larga escala do Livro Sagrado dos cristãos?
Como ser a favor de quem está contra e se posicionar contra quem está a favor?
Qualquer semelhança com a música cantada por Waldick Soriano, que diz: “Quem eu quero, não me quer. Quem me quer, mandei embora”, talvez não deva ser considerada como mera coincidência”.
Em tempos de polarização exacerbada pelo controle da nova ordem mundial, não é a primeira vez (nem será a última) em que os polos podem ser bruscamente trocados.
Portal Repórter Brasília, Edgar Lisboa
Muito curioso constatar essa aparente contradição. Resta saber se esse crescimento na produção de bíblias na China está relacionado com uma maior abertura do governo em relação à liberdade religiosa ou apenas faz parte da estratégia do pais de ser a fabrica do mundo.
Curiosamente vi recentemente um video mostrando que até o famoso boné do Trump com a inscrição MAGA é “made in China”.