Deprecação ou Imprecação? (Josué Silva)

Josué Silva/Divulgação

Deprecação é desejar a alguém uma coisa boa, algo de bom, uma bênção (Que Deus te abençoe!). Imprecação é desejar a alguém uma coisa ruim, algo mau, uma praga (Raios te partam!). Face a isso, uma pergunta básica quero fazer: É mais fácil abençoar ou amaldiçoar?

Depende, a grande maioria vai responder. Depende de quem é o agente e de quem é o paciente, ou seja, depende de quem está abençoando ou amaldiçoando e de quem está sendo abençoado ou amaldiçoado.

Depende, também, de quem é a pessoa a ser abençoada ou amaldiçoada. É minha amiga ou minha inimiga? Se for minha amiga, bênção; se, minha inimiga, maldição. Pronto. Está resolvido o problema. Fácil solução, não?

Está resolvido o problema? É claro que não, pois há outros dependes.

A pessoa defende o que eu defendo? A pessoa gosta do que eu gosto? A pessoa pode me favorecer? A pessoa vota no mesmo candidato em que eu voto? A pessoa é amiga do amigo do meu amigo? O que eu ganho se abençoá-la? (Pense nos profetas comprados para abençoar porque ganham dinheiro com isso.) O que ganho se amaldiçoá-la? (Lembre-se de Balaão – Números 22-24. Ele tinha muito a ganhar se amaldiçoasse os filhos de Israel.)

O livro dos Salmos – certamente – é o mais conhecido da Bíblia. Nele, encontramos Salmos para todo tipo de situação que o ser humano pode viver. É o livro da liberdade da alma se extravasar diante de Deus abrindo-se para Ele.

Há Salmos para quem está triste, alegre, feliz, infeliz, animado, desanimado, confiante, inseguro, conformado, revoltado, querendo morrer, querendo matar e aí por diante. Os usados pelos que querem o bem de alguém são chamados de deprecatórios. Os usados pelos que querem o mal de alguém são chamados de imprecatórios (Ex. 5, 6, 35, 58, 69, 83 e 109 – É importante mencionar que não são todos os versos desses salmos. São alguns versos).
Não é muito comum – pode até acontecer – se recomendar uns versos de um Salmo imprecatório para alguém. Isso é muito agressivo e deselegante, mas, diga a verdade: Dá ou não dá vontade de assim proceder de vez em quando?

Os Salmos são cânticos a Deus, são manifestações de dependência do Senhor. Até os imprecatórios? Sim. Lá estão porque querem nos ensinar, no mínimo, dois princípios que devemos aprender, guardar e praticar.

Princípio um – que, aos pés do Senhor de todas as coisas, podemos desnudar nossa alma e a Ele revelar o que está no mais recôndito de nosso ser. Nada de querer esconder dEle, pois, dEle, ninguém esconde nada. Ainda que sejam sentimentos e desejos tenebrosos e trevosos. A Ele, podemos abrir o nosso coração de par em par. Só a Ele, visto que Ele nos entende e nos acolhe.

Princípio dois – que, quando abrimos nossa boca e revelamos ao Senhor nossos sentimentos mais reprováveis, nós nos libertamos deles, nós nos livramos deles, nós nos curamos porque isso é terapêutico. Isso quer dizer que, após a revelação de alguns desejos imprecativos, sem perceber, começamos a revelar alguns desejos deprecativos, como “tenha, Senhor, misericórdia desse cabra safado, desse sujeito sem vergonha, desse elemento sem compostura” e por aí avante.

A prática da imprecação torna a alma amarga, fria e maligna. Ela revela uma alma doente e doentia. Sempre a acompanhará a maledicência. A imprecação, já sabemos, é desejar o mal e a maledicência é falar mal. As duas andam juntas e promovem muita dor. Elas promovem muita dor porque revelam a dor dos que amam essas duas práticas.

É por isto que temos Salmos imprecatórios: para que pessoas imprecatórias e maledicentes se curem, pois o lugar ideal para destilarem esse veneno é aos pés do Senhor que cura, que liberta, que alivia toda e qualquer dor seja no corpo, na alma ou no espírito.

A maledicência é a mãe da murmuração. O murmurador fala mal de tudo. A Bíblia nos dá exemplos sobejos de que a murmuração serve não só para nos impedir de entrar na terra prometida mas também para que morramos no deserto.
A recomendação bíblica é que devemos orar sem cessar (1Ts 5.17). Falar com Deus tudo e o tempo todo. Tudo está sob o controle dEle. Nada acontece sem que Ele permita. Ele é essencialmente pedagógico e está sempre a nos ensinar. Ele nos ensina tanto quando a vontade dEle prevalece quanto quando nossa vontade prevalece.

Devemos orar por tudo e por todos. Não há recomendação para fazermos o tempo todo deprecação ou o tempo todo imprecação. Vai depender de cada um.

A deprecação abençoa e quem abençoa é abençoado. A imprecação amaldiçoa e quem amaldiçoa vive amargurado, revoltado, pois Deus não é seu joguete e, por isso, não fará o que ele quer, do jeito que ele quer e quando ele quiser.

Estamos vivendo dias de muita imprecação e pouca deprecação. Aqueles dependes já mencionados saíram do saco sujo e abjeto do jogo de interesses. Não importa se os interesses são morais ou imorais, legais ou ilegais, se honram a Deus ou o desonram, se enaltecem o gênero humano ou se o envilecem.

Sempre foi preciso que oremos. Hoje mais que ontem e amanhã mais que hoje. Somos, de modo geral, apressados em falar sobre quase tudo e tardos em falar tudo para Deus. Oramos pouco. Às vezes, ficamos só nas duas primeiras sílabas da palavra oração: orar. Não podemos nos esquecer das duas outras sílabas dessa palavra: ação.

Se vamos fazer o que temos que fazer abençoando, que assim seja. Se amaldiçoando, que assim seja. Mas, repito, fica a critério de cada um, pois cada um responderá por si diante de Deus.

Josué Silva é professor, pastor, teólogo, palestrante, conselheiro cristão, master terapeuta emocional da Terapia de Reprocessamento Generativo (TRG), escritor e membro da Academia Evangélica de Letras do Distrito Federal.

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