
Os agricultores franceses voltaram às ruas nesta quarta-feira (12), em Toulouse, para protestar contra o Acordo União Europeia–Mercosul. A visita de Emmanuel Macron à cidade coincidiu com a insatisfação crescente do setor, irritado com as declarações do presidente francês feitas no Brasil durante a COP30, quando ele demonstrou otimismo com o tratado. Os produtores exigem “compromissos claros e firmes” e acusam o acordo de abrir as portas para uma concorrência que consideram injusta: produtos sul-americanos, segundo eles, chegariam ao mercado europeu sem cumprir as mesmas regras ambientais e sanitárias impostas aos agricultores locais. A verdade é que a ira do agricultor francês é de mercado, não ideologia.
França sempre protecionista
A França, historicamente protecionista em relação ao seu setor agrícola, reage sempre que enxerga risco de perda de mercado. E a mobilização atual reforça como, para o produtor europeu, o discurso ambiental ou geopolítico perde espaço diante do simples instinto de sobrevivência econômica.
Diplomacia em movimento
O tema voltou ao centro da agenda internacional com a reunião, no Canadá, entre os chanceleres Mauro Vieira (Brasil) e Jean-Noël Barrot (França), às margens da cúpula do G7. A União Europeia pretende votar a ratificação do acordo ainda este ano no Conselho Europeu e no Parlamento, abrindo caminho para a entrada em vigor de um tratado que leva 25 anos sendo negociado.
Macron otimista, mas vigilante

Macron diz estar “otimista, mas vigilante”, tentando equilibrar as exigências internas com os interesses estratégicos de longo prazo da UE. Para Bruxelas, o acordo com o Mercosul é peça central na disputa comercial global, especialmente diante da pressão dos Estados Unidos e da crescente competição com a China. Mas essa visão macro nem sempre alcança o agricultor do interior da França, que enxerga no produtor brasileiro um adversário direto, mais competitivo e menos engessado.
Alceu Moreira: “É defesa de mercado. E a Europa sabe disso”.

Em entrevista à coluna Repórter Brasília, o ex-presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, Alceu Moreira, sintetiza a crise com clareza. Segundo ele, não há animosidade contra o Brasil: há medo de perder espaço nas prateleiras europeias. Foi assim com o frango brasileiro em Londres e será assim com carne, vinho, etanol ou qualquer produto em que o Mercosul tenha vantagem competitiva.
Custo europeu mais alto
Moreira lembra que o custo de produção europeu é incomparavelmente mais alto, chegando a ser 18 vezes maior no caso da carne produzida na Irlanda do Norte. “Quando a nossa carne chegar lá, eles morreram”, afirma. O protesto francês, portanto, é um grito previsível, quase instintivo. Mas, no conjunto dos interesses da UE, representa apenas “uma gota no oceano”.
Bloco europeu tem muito a ganhar
A leitura estratégica, segundo ele, mostra que a Europa como bloco tem muito mais a ganhar com a integração com o Mercosul do que a perder. Resistências pontuais existirão e devem ser administradas politicamente, mas não são suficientes para barrar um acordo de peso geopolítico e econômico tão grande.
O Brasil precisa firmeza, não hesitação
O Brasil não pode assistir passivamente ao jogo europeu. A pressão dos agricultores franceses é legítima dentro do contexto deles, mas não pode ditar o rumo de um acordo que interessa ao Mercosul e fortalece a posição do país no mercado global.
Confiança na competitividade
É preciso firmeza diplomática, clareza técnica e confiança em nossa competitividade. O mundo caminha para blocos mais integrados, cadeias mais amplas e comércio mais ágil. A França protestará como sempre fez. Já o Brasil precisa decidir se quer ser protagonista ou espectador.
A Coluna Repórter Brasília é publicada simultaneamente no Jornal do Comercio, o jornal de economia e negócios do Rio Grande do Sul.
Edgar Lisboa